POR FAVOR, NÃO INVALIDEM OS CASAIS SEM FILHOS

Flórence Diedrich

11 de janeiro de 2017

Psicologia

Por muito tempo, o principal papel esperado socialmente de um jovem casal,  era ter filhos.

O valor da mulher estava atrelado a prole. O papel esperado do homem, era o de chefe de família. Dentro desse contexto, a possibilidade de ter uma vida satisfatória e a ideia de felicidade, para um casal, estava exclusivamente vinculada a maternidade.

Hoje em dia, as possibilidades de formato das famílias é muito maior.  Homens e mulheres tem a possibilidade de pensar e decidir se há o desejo de serem pais.  Apesar disto, nem sempre a informação de que alguém não deseja ter filhos é bem recebida na família e na sociedade. Ainda é comum que expectativas pressionem a mulher, o homem ou o jovem casal sem filhos.
Apesar de, na atualidade existir uma gama muito maior de fontes de satisfação e sentido na vida, a sociedade ainda se choca perante a revelação de alguém não querer ter filhos. Como se não estivesse "cumprindo seu papel". Como se os filhos fossem o único caminho possível (ou correto)...como se a mulher ou o casal não pudesse ter uma vida plena de sentido com outras realizações, como seus vínculos com amigos ou familiares, como seu trabalho, como sua liberdade para explorar o mundo...

Basta ter passado do 30, estar em um relacionamento estável e ter uma condição relativamente estável de vida, que possivelmente a pergunta mais frequente que se escuta é: "Quando vai vir um bebê?"

Para a maioria das pessoas, não é fácil frustrar os demais, ainda mais quando os "demais" são amigos próximos e familiares, que fazem a bendita pergunta com brilho nos olhos e um coração cheio de expectativas e amor para receber o "pequeno serzinho".

É emocionante ouvir que um amigo ou parente guardou o carrinho ou a roupinha do seu bebê para "o futuro amiguinho(a)". Que quer dividir conosco objetos que permearam momentos incriveis e de muito amor, da sua experiência parental. Que no coração deles, já exista espaço para essa criança que ainda nem foi concebida.

Eles vivenciaram uma experiência fantástica e transformadora e, com isso, querem que os que ainda "não sentiram isso", sintam.

Isso me faz pensar nas pessoas que buscam algum tipo de fé religiosa e isso traz um sentido enorme para suas vidas, com isso, querem a todo custo, evangelizar os entes queridos e dividir suas descobertas, fazendo convites incessantes para que possamos conhecer "aquele lugar". Com algumas pessoas que tiveram filhos, a dinâmica é parecida.

Dentro disso, já ouvi discursos como:

"Vocês não sabem o que é viver, até ter um filho"

"Depois de um filho que você saberá o que é amor e felicidade de verdade"

UAU, que carga para uma criança.

Imagino o quanto seja incrível ter um filho, eu jamais invalidaria uma experiência tão grandiosa como a maternidade/paternidade. Porém, será justo invalidar a vida e as experiências de homens e mulheres que optaram por não terem filhos?

Eles que não tem o desejo de ter filhos, podem sentir que "tem algo errado". Tem algo errado por serem felizes sem filhos, logo devem ser pessoas egoístas por se sentirem assim, por verem um sentido incrível em suas vidas do jeito que está.

Sim, acredito em uma vida esplêndida, cheia de amor e sentido, em uma família com filhos. Mas também penso que o mesmo possa existir, em um casal ou individuo que opta por não tê-los.

Afinal, será que o amor não está em nós, enquanto fonte e canalizadores deste sentimento nas nossas experiências e diversas relações?

Entendo que, quando vivenciamos algo especial e grandioso, seja natural e até honrável querer dividir isso com aqueles que amamos, esperar que nossos amigos ou parentes, também tenham essa experiência e vivam esse amor transformador. Porém precisamos dar espaço para que, se esse sentimento vier, que venha "de dentro" e não de fora. E que se não vier, "está tudo bem", essa pessoa ainda pode saber o que é o amor e ter uma vida plena de sentido.

O importante, é não nos fecharmos em "uma verdade", validar a pluralidade, a liberdade de escolha e as vivências singulares de cada um.

A "continuidade" da nossa existência pode vir de variadas formas... Acredito que existem muitos caminhos para vivenciarmos o amor, ter filhos é um deles, não o único.

Por: Psic. Flórence Diedrich.